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Cosmograma Bakongo ou como entender a vida

Para nós do Candomblé Kongo-Angola nossa fé não se restringe aos momentos onde estamos no terreiro, exercendo nossas funções e festas dedicadas aos Minkisi (plural de Nkisi). Na verdade, nossas crenças atravessam todos os momentos de nossas vidas, desde quando acordamos até o momento em que vamos dormir. São modos de vida e de compreender o mundo em que vivemos. Estamos constantemente nos comunicando com nossos Minkisi e ancestrais, e eles compõem nossas vidas cotidianas, nos orientando em nossas decisões, se apresentando nos elementos da natureza, em nossos pensamentos, nossas virtudes e tradições, é isso que chamamos de Cosmologia. Os Kongo em África pensam da mesma forma, segundo Bunseki Fu-Kiau, “nada na vida diária da sociedade Kongo está fora de suas práticas cosmológicas” (SANTANA, 2019, p.34), e são essas práticas e visões que estruturam não só a religião, mas também o cotidiano desses povos Bantu. 

Para entendermos como os Kongo e, consequentemente, nós na diáspora entendemos o mundo e nossa fé, é necessário compreendermos o Cosmograma Bakongo, a transcrição em imagem e linguagem gráfica de sua forma de enxergar o mundo:

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O Cosmograma é um círculo atravessado por duas linhas, uma vertical, e outra horizontal, formando em seu centro uma encruzilhada, denominada yowa. Nas extremidades das linhas temos circunferências menores, que representam o sol e seu movimento ao redor da terra, iniciando ao leste e se pondo no oeste. Ao se por, morre e submerge no mar, porém, continua em seu movimento circular até renascer no dia seguinte (THOMPSON, 1983, p.112-114).

 

Este movimento circular do sol, também representa a vida humana em suas quatro etapas. Cada um de nós é um sol, nascemos em Kala, atingimos nosso auge da vida física ao meio-dia em Tukula, morremos no por do sol e atravessamos para o mundo dos mortos em Luvemba, atingimos o auge de nosso espiritual em Musoni, até chegarmos a nosso renascimento em Kala, novamente. Assim, a linha horizontal, Kalunga, não é apenas o mar em que o sol mergulha, mas a fronteira entre o mundo dos vivos, Ku Nseke, e o mundo dos mortos, Ku Mpemba. Enquanto a linha vertical representa o caminho do poder, no mundo dos vivos e dos mortos, Tukula sendo onde estão os líderes de nossas comunidades e Musoni os ancestrais que cultuamos (THOMPSON, 1983, p.112-114).

 

Como podemos perceber, a linha vertical liga os líderes da comunidade aos ancestrais, isso porque os mais poderosos e sábios do mundo físico precisam estar sempre em contato com os mais poderosos e sábios do mundo espiritual, um não pode existir sem o outro. Nossos ancestrais são aqueles que trazem orientação para as lideranças, cuidam de nossas comunidades e guiam nossas vidas cotidianamente. Cada um de nós é um sol e é um dever de toda comunidade junto aos ancestrais e nosso objetivo individual garantir que conseguiremos chegar ao auge de nossas vidas, ao meio-dia. 

 

Kiuá a todos os ancestrais que nos guiam diariamente, aweto àqueles que nos orientam por toda a nossa vida e a todo momento, que nos façam grandes e que cheguemos ao nosso auge!